quarta-feira, 30 de junho de 2010

Amigos!

“Se eu morrer a uma quarta, só me encontram na sexta!” Desabafei eu a um amigo, que ainda hoje se ri, quando se lembra da frase “doida de manicómio” (como lhe chama)! Isto porque mais uma vez estava eu a falar-lhe dos meus devaneios, medos, anseios e o maior de todos, a morte, consome-me mais tempo do que devia, e realmente, tal como ele me aconselhou deveria preocupar-me mais em viver e deixar-me de pensar na morte. A minha irmã passa os fins-de-semana comigo, chega à sexta, daí o encontro. Encontro do corpo, porque a alma, essa já devia estar na fila do purgatório. Viver sozinha tem destas coisas, se morrer em casa durante a semana, a minha irmã poderá finalmente dizer-me um ultimo adeus na sexta feira, quando chegar de fim de semana, e que fim de semana! Parece mórbido, tétrico, uma perda de tempo até, bem sei. Sei que contra ela nada a fazer, mas se calhar se a encarássemos de outra forma, e falássemos dela mais vezes, talvez não fosse pior, talvez, quem sabe, a veríamos com outros olhos, mais abertos e menos periclitantes. O facto de viver sozinha, e por vezes me deitar desperta, dá nestas coisas…penso no que não devo, ou devo? Pensar que vou morrer, e como gostaria de morrer é assim tão dramático? É. Com outro amigo desabafei “ … e porque gosto tanto de viver, tenho este pavor de morrer”. E mais uma vez, ouvi palavras sábias, “ mas isso assim não é viver, vais morrendo todos os dias. Sendo a morte inevitável, porque não aproveitas a vida de que tanto gostas e te preocupas com a morte apenas quando ela chegar?!”. Estes são os meus amigos, o meu orgulho! Vou lembrar-me sempre disso, quando ela chegar preocupo-me com ela. Por agora viverei. Vou aproveitar e quando tiver insónias pensarei nos meu amigos, esses de quem não me quero separar, esses que me fazem gostar tanto de viver, esses que me ensinam todos os dias a chegar a sexta feira viva, depois de uma quarta feira "de morrer"! Amigos, esses que me abrem os olhos, que mos secam e também os fazem brilhar. Não viveria sem eles, e afinal tenho sorte, porque tenho os melhores amigos do mundo. Morrer? O que é isso? Estou demasiada ocupada com os meus amigos, a viver!

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Por acaso!

Faço por acaso, e por acaso gosto de o fazer. Captar imagens dos momentos, em mente ou em lente. Nunca chega para vive-las de novo, mas chega para sonha-las. Impressiona-me a quantidade de vezes que falo em sonhos, a vida é feita também do imaginário que criamos para ela. Na realidade sonho, quase todos as noites sonho, e quase todos os dias me lembro. Nunca são serenos, pacíficos, nunca são sonhos que sonho acordada. São sonhos inquietantes, ambíguos, enigmas, tramas, dramas. São a areia no meu sapato de cristal, mas sem a qual poderia esquecer que além dos jardins desabrochados, existe também uma estrada dura para caminhar. Estranho, prefiro lembrar-me, que acordar sem os ter sentido. Como se a noite me permitisse viver outras vidas, como se o facto de estar deitada, inerte, não fosse um vazio, uma pausa, uma privação da vida que não posso desperdiçar. Chego a ter medo de sentir que preciso da tempestade para saborear a bonança. Não, não preciso. Preciso sim, que as nuvens me tapem o sol por momentos, que a minha pele esta a escoriar, preciso que o céu limpo por vezes se transforme em imagens de algodão, e que trace caminhos de vários cores, por onde possa deambular. Mas agora que penso na tempestade, posso vê-la como bonita. É loucura minha? Será pecado gostar de vislumbrar um céu cinzento carregado de rasgos de luz que fulminam este mar magnânimo? Chuvas incessantes que de tão forte parecem irromper esta sala envidraçada, aquecida pela lareira que crepita. Assombro delicioso, sentir este calor, e tu ai a estender-me a taça de champanhe ao som de Carmina Burana. Este cenário, encenado, esta imagem poderosa, do quente versus gélido, do mar versus chama, dos raios estrondosos que se fundem entre Carl Orff e trovões, será idílico, ou será fustigante? Afinal aqui deste porto de abrigo atrai-me esta tempestade. Chama por mim, desperta parte de mim. Saboreio a bonança, mas gosto do travo da tempestade Que alma inquieta esta, que entre sonhos e pesadelos, tem medos, desejos, anseios, dúvidas, muitas dúvidas, mas que nunca ninguém poderá dizer que não foi porque adormeceu, que não fez porque fraquejou, que não esteve porque desacreditou. E estas são as imagens cintilantes que construo e que me salvam nos desfiladeiros turvos. Porque o acaso é assim, acontece, mas por acaso não se esquece.