sexta-feira, 18 de junho de 2010

Por acaso!

Faço por acaso, e por acaso gosto de o fazer. Captar imagens dos momentos, em mente ou em lente. Nunca chega para vive-las de novo, mas chega para sonha-las. Impressiona-me a quantidade de vezes que falo em sonhos, a vida é feita também do imaginário que criamos para ela. Na realidade sonho, quase todos as noites sonho, e quase todos os dias me lembro. Nunca são serenos, pacíficos, nunca são sonhos que sonho acordada. São sonhos inquietantes, ambíguos, enigmas, tramas, dramas. São a areia no meu sapato de cristal, mas sem a qual poderia esquecer que além dos jardins desabrochados, existe também uma estrada dura para caminhar. Estranho, prefiro lembrar-me, que acordar sem os ter sentido. Como se a noite me permitisse viver outras vidas, como se o facto de estar deitada, inerte, não fosse um vazio, uma pausa, uma privação da vida que não posso desperdiçar. Chego a ter medo de sentir que preciso da tempestade para saborear a bonança. Não, não preciso. Preciso sim, que as nuvens me tapem o sol por momentos, que a minha pele esta a escoriar, preciso que o céu limpo por vezes se transforme em imagens de algodão, e que trace caminhos de vários cores, por onde possa deambular. Mas agora que penso na tempestade, posso vê-la como bonita. É loucura minha? Será pecado gostar de vislumbrar um céu cinzento carregado de rasgos de luz que fulminam este mar magnânimo? Chuvas incessantes que de tão forte parecem irromper esta sala envidraçada, aquecida pela lareira que crepita. Assombro delicioso, sentir este calor, e tu ai a estender-me a taça de champanhe ao som de Carmina Burana. Este cenário, encenado, esta imagem poderosa, do quente versus gélido, do mar versus chama, dos raios estrondosos que se fundem entre Carl Orff e trovões, será idílico, ou será fustigante? Afinal aqui deste porto de abrigo atrai-me esta tempestade. Chama por mim, desperta parte de mim. Saboreio a bonança, mas gosto do travo da tempestade Que alma inquieta esta, que entre sonhos e pesadelos, tem medos, desejos, anseios, dúvidas, muitas dúvidas, mas que nunca ninguém poderá dizer que não foi porque adormeceu, que não fez porque fraquejou, que não esteve porque desacreditou. E estas são as imagens cintilantes que construo e que me salvam nos desfiladeiros turvos. Porque o acaso é assim, acontece, mas por acaso não se esquece.

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